Já não é cedo e da janela do meu quarto, num prédio alto à frente do meu, há uma luz, a única luz acesa em tantas e tantas janelas.
A persiana está puxada até ao cimo e os cortinados de linho branco completamente arredados. Surge então à janela uma mulher morena, de top vestido e cabelo solto. Debruça-se para apanhar um pouco desta brisa nocturna que refresca o rosto quente. Sentado à mesa, com o jantar diante dele encontra-se o marido, cabelos oleosos, compridos e barba de já algumas semanas. Olhar pesado e rosto marcado. É ainda jovem mas traz com ele algo de muito antigo, não sei se o espírito, talvez. Enquanto jantam não se olham, trocam apenas uma ou duas palavras a cada copo que enchem ou a cada garfada que levam à boca. São frios, arrisco a dizer que nem sequer se amam. Ele levanta-se, limpa os cantos da boca com o guardanapo e vai para outra divisão da casa que não consigo desvendar através da janela do meu quarto. Poucos minutos depois, é a vez de ela acabar. Recolhe os dois pratos e vai. Volta. Recolhe os dois copos e a garrafa de vinho tinto e vai. Volta por fim para se prostrar diante da televisão, a sua única e inseparável amiga. É com ela que desabafa, é a ela que conta os tristes e nada empolgantes momentos do seu dia. A monotonia e a perspicácia da rotina tornaram tudo muito distante do que tinham sonhado para eles. Ele chega sempre tarde, com uma expressão carregada e com pressa de se ir deitar. Ela espera-o, serve o jantar e prossegue pelos meandros rotineiros da sua vida vazia…
Sempre que chega a casa, está dez minutos a observar as crianças que brincam no parque. Quer muito ser mãe, não sabe se com aquele pai.
domingo, 18 de julho de 2010
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